segunda-feira, 30 de julho de 2012

Patologia mamária: lesões proliferativas intraductais e neoplasia lobular. Nomenclatura atual (2012)

Em diversas oportunidades temos analisado e discutido as nomenclaturas DIN e LIN na patologia mamária, seja através de palestras, participações em mesas redondas e inclusive neste blog. Promovidas pela Dra. Tavassoli, foram estabelecidas nas publicações de sua autoria de 1997-98 e modificadas em posteriores textos (2003, 2007-9)(1). Especificamente a de 2003 consta no livro da OMS sobre patologia mamária (2) sem que efetivamente tenha sido recomendado seu uso. Em 2009, Umberto Veronesi e cols. publica no Breast Journal um curto texto em que propõe uma mudança no TNM para mama e clama pelo uso das classificações DIN e LIN, com o argumento de que a paciente interpreta que a lesão classificada como “carcinoma in situ” não é uma lesão precursora e sim um “câncer”.(3) No mesmo ano, é publicado o livro de Schnitt e Collins sobre interpretação das biopsias de mama (4), sem fazer nenhuma referência aos critérios de Tavassoli. O novo livro da OMS (5) recentemente publicado não utiliza a proposta da Tavassoli e mantém a nomenclatura tradicional. Um dos argumentos explicitados é o fato do sistema DIN não ter conseguido a aceitação dos principais patologistas de mama nem da comunidade de patologistas. Como comentaram patologistas que participaram da Reunião de Consenso em 2011 prévia à publicação da WHO (6)(comunicação pessoal), não podem ser transferidos os critérios utilizados na interpretação morfológica do processo de carcinogênese dos epitélios escamosos às manifestações do epitélio glandular mamário. Há novas teorias baseadas em conhecimentos de biologia molecular que apontam para caminhos diferentes na evolução dos tumores da mama. Deste modo nós, que seguimos as diretrizes das principais organizações médicas que orientam nosso trabalho de patologistas (WHO, IARC, CAP, etc.), incorporamos os critérios atuais estabelecidos pela WHO 2012 e deixamos de utilizar a DIN/LIN em nossos laudos. Bibliografia (1)Tavassoli FA, Eusebi V (2009). Ductal intraepithelial neoplasia. In: Tumors of the mammary gland. Tavassoli FA, Eusebi V, eds. AFIP atlas of tumor pathology. Fourth series; fasc. 10. American Registry of Pathology in collaboration with the Armed Forces Institute of Pathology: Washington, D.C.: pp 67-100. (2)Tavassoli FA, Devilee P, eds (2003). WHO classification of tumours of the breast and female genital organs, 3rd edition. IARC: Lyon, France. (3)Veronesi U, Zurrida S, Viale G, Galimberti V, Arnone P, Nolè F. Rethinking TNM: a breast câncer classification to guide to treatment and facilitate research. The Breast Journal 2009;15(3):291-295. (4)Schinitt SJ, Collins LC (2009). Biopsy interpretation of the breast. Schnitt SJ, Collins LC, eds. Biopsy interpretation series. Wolters Kluwer/Lippincott Wiliams & Wilkins: Philadelphia. (5)Lakhani SR, Ellis IO, Schnitt SJ, Tan PH, van de Vijver MJ, eds (2012). WHO classification of tumours of the breast, 4th edition. IARC: Lyon, France. (6)The WHO Classification of Tumours of the Breast presented in this book reflects the views of a Working Group that convened for a Consensus and Editorial Meeting at the International Agency for Research on Cancer (IARC), Lyon September 1-3, 2011.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

REVISITANDO PAPANICOLAOU

Falar em prevenção do câncer de colo uterino é lembrar-se de Papanicolaou. Sua técnica para a detecção de células malignas num esfregaço, mundialmente conhecida como o Pap ou preventivo ginecológico, foi o grande motor para a redução da mortalidade por esta doença no século XX. Porém, por diversas causas, ela não é capaz de identificar todas as pacientes que portam lesões no colo uterino. Somente o fará em 50% delas. Ou seja, a metade das mulheres com lesão receberá um diagnóstico de benignidade e, portanto, um falso-negativo. Este diagnóstico é pior que um falso-positivo. Enquanto neste último um estudo subsequente irá mostrar o erro, no outro, ao comunicar à paciente e ao médico um falso estado de benignidade postergará a ação que deveria ser tomada para controlar a doença, perdendo-se a oportunidade de cura. Pode acontecer que ao retornar a paciente à consulta a doença se encontre num estado mais avançado. Esta baixa sensibilidade e suas consequencias levaram no final do século passado à busca de novas alternativas. A citopatologia em meio líquido se mostrou viável rapidamente e inicialmente o ThinPrep™ (Cytyc Co.) e posteriormente o SurePath™ (Becton, Dickinson and Co.), pela suas simplicidades, automação e, principalmente, pela maior capacidade na detecção das doenças, tornou-se o substituto ideal do clássico Pap. Diversos países (Gran Bretanha, USA, Canadá, etc.) e renomados centros médicos (A.C.Camargo de São Paulo) têm optado pelo meio líquido. Ambos os métodos tem sido aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos da América para substituir o Pap tradicional. A relação do vírus do papiloma humano (HPV na sigla inglesa) com diversos cânceres representou um novo paradigma, apontando para a etiologia viral. O patologista ou citopatologista ao estudar a as amostras identifica alterações morfológicas nas células atribuídas à ação viral e classifica as lesões em intra-epiteliais (ou pré-neoplásicas) ou em invasivas. Para complementar estes estudos surgiram técnicas e métodos da biologia molecular que permitiram confirmar a presença do vírus no núcleo das células. Estes métodos sejam pela Captura Híbrida™ (Digene, Qiagem) ou pela técnica da PCR (reação em cadeia pela polimerase na sigla inglesa) foram difundidos rapidamente e seus resultados contribuem muito para o diagnóstico e para estabelecer com precisão o risco. Dada a existência de diversos tipos de vírus HPV foram definidos grupos de risco neoplásico (alto ou baixo), em relação à possibilidade de vir acontecer uma lesão maligna invasiva. O trabalho realizado na Índia pelo Dr. Rengaswamy Sankaranarayanan, da Agencia Internacional para Pesquisas em Câncer, de Lyon, França, financiado pela Fundação Bill e Melinda Gates, obteve conclusões surpreendentes. Estudou 131.746 mulheres entre 30 e 59 anos durante 8 anos. No texto, publicado na prestigiosa revista científica The New England Journal of Medicine, o cientista estabeleceu que o grupo dos pacientes que realizou a detecção genômica do vírus utilizando a Captura Híbrida™, teve uma significativa redução na taxa de mortalidade quando comparado com o grupo controle e com o grupo estudado pelo Pap. O mais interessante, porém, é que nenhumas das mulheres com um resultado negativo pela Captura Híbrida™ faleceram por câncer de colo uterino. Isto representou uma significativa redução na taxa de falso-negativos. Brasil, neste início do século XXI, está preste a se transformar numa potência mundial. Nada mais justo. Porém, no caso da detecção precoce das lesões do colo uterino, a grande maioria de suas estruturas de saúde continua utilizando as mesmas técnicas estabelecidas no início do século passado. Papanicolaou foi um pioneiro naquela época. Se hoje fosse vivo, com certeza, lutaria pela implantação da citologia em meio líquido e pela detecção do vírus no genoma celular. Oferecer estas possibilidades é um imperativo: a ciência exige e a mulher merece. Estamos na hora de mudar.